Antonio Baruty
Professor da UFPB e
Integrante do NEABI/UFPB
20 de novembro é a data, em que no Brasil, comemora-se o dia da consciência negra e homenageia-se Zumbi, o grande líder do quilombo dos Palmares e que marca o seu desaparecimento físico, ocorrido em 1695. Hoje é o primeiro 20 de novembro, pós-eleição-2018, de um país que escolheu, por intermédio das urnas, como representante do Executivo Federal, um cidadão que se refere às pessoas negras; aos quilombolas (e outros grupos sociais), como se estes/as não fossem humanos. Uma pessoa que se nobilizou, em diferentes ocasiões por propalar um discurso desmerecedor contra homens e mulheres cuja a cor da pele é a mesma da noite, nos mostrando, mais uma vez, a inexistência da tão exaltada e propalada Democracia Racial brasileira.
O 20 de novembro tornou-se, oficialmente, como uma data comemorativa por meio da Lei 12.519 de 2011, porém não é um feriado nacional. Informações obtidas junto a SEPPIR nos dão conta de que 388 cidades brasileiras tornaram esta data um feriado municipal. Ainda de acordo com este órgão público, tramita no Congresso Nacional a Lei nº 4.437/04, que pretende instituir o dia 20 de novembro, como feriado nacional.
Nunca é demais assinalar que o 20 de novembro foi uma proposta política dos movimentos sociais negros da década de 1970. Um importante liderança negra, Abdias do Nascimento (1914 – 2011), em seu livro “O Quilombismo”, de 1980, ao referir-se a esta data propõe que a mesma seja o momento de culminância de uma série de atividades desenvolvidas ao longo do ano, porém, o que se observa é que enaltece-se o dia, porém são raros os processos educativos que ocorram ao longo do ano e que tenham o 20 de novembro como a data maior de seu calendário.
Uma grande vitória do Movimento Social Negro Brasileiro, foi a promulgação de Lei N0 10.639/2003 que torna obrigatória, em todos estabelecimentos de ensino, fundamental e médio, o estudo de temas ligados a população negra brasileira e africana, e esta, de acordo com fontes consultadas, foi regulamentada em 18 estados brasileiros. Na Paraíba a regulamentação da Lei deu-se em 2010 e na cidade de João Pessoa no ano de 2006. Nesta capital, tivemos a elaboração das Diretrizes para a implantação da Lei n° 10639/2003 e passando a haver a obrigatoriedade de que os temas os quais são o fulcro desta lei fossem levados para a sala de aula pelo menos duas vezes a cada bimestre, algo que vislumbra um melhor enfrentamento as discriminações a que nós pessoas negras estamos diariamente expostos/as e pode contribuir também para a diminuição do alarmante número de jovens negros/as vítimas de homicídios resultantes do racismo institucional.
No campo do ensino superior, a UFPB, no ano de 2015, aprovou a Resolução CONSEPE n° 16, que instituiu a obrigatoriedade da Educação para as relações étnico-raciais em todos os cursos de graduação presenciais ou virtuais dessa instituição de ensino superior. Antes desta deliberação, a discussão da temática somente havia sido incluída, de forma oficial, pelos cursos de Licenciatura em História, Direito, no câmpus de João Pessoa e no Areia no curso de Ciências Biológicas. Uma regulamentação, mesmo que tardia, 12 anos após a assinatura da Lei n° 10639/2003, que provê um processo educativo tem possibilitado o enfrentamento ao racismo, ao preconceito e a discriminação racial.
Os/As brasileiros/as orgulham-se de não serem preconceituosos, porém, nacionalmente, de cada 100 pessoas 98 que afirmam não apresentarem este tipo de comportamento, mas 97 conhecem alguém que em algum momento foi racista. Como podemos perceber, estes números não fecham. A sociedade brasileira precisa reconhecer a existência e a prática racista no nosso cotidiano e um dos caminhos para se construir novas relações sociais passam por ações educacionais amplas e com a adoção de políticas públicas específicas. Só assim veremos o arrefecimento dos alarmantes números os quais colocam a população negra brasileira numa permanente situação de vulnerabilidade social. Talvez seja esta conta que não fecha o mote impulsionador que levou milhões de eleitores/as a optarem por um candidato que por mais de uma vez expressou uma opinião racista/negativa contra negros/as.
Neste 20 de novembro de 2018, além de comemorar, será necessário, mais do que nunca, um pacto de união entre os/as integrantes das diversas vertentes do Movimento Social Negro, com forças progressistas no sentido de uma constante vigília e denúncia e busca por reparações contra todo e qualquer ato que vise agredir e ou a diminuir direitos desta expressiva parcela da população brasileira, somos 53,6%, e de outros grupos historicamente excluídos de nossa sociedade. Nesse sentido, torna-se de extrema importância iniciativas como a do recém lançado Observatório Interinstitucional de Violências por Intolerância (Paraíba), o qual terá como papel monitorar casos de violência por intolerância sexual, identidade de gênero, cor, raça, etnia, orientação ideológica, política, entre outras.
20 de novembro é também o dia de nos mobilizarmos por políticas pública em defesa de negros/as brasileiros/as bem como de homenagearmos importantes lideranças, tais como: Lélia Gonzales (1934 – 1994), João Balula (1960 – 2008), Beatriz Nascimento (1942 – 1995), Abdias no Nascimento (1914 – 2011), Luiza Bairros (1953 – 2016), Antônio Pompeo (1953 – 2016), Oliveira Silveira (1941- 2009), Laudelina de Campos Melo (1904 – 1991), Milton Santos (1926 – 2001), Dom José Maria Pires (1919-2017), Bispo do Rosário (1909 – 1989), Marielle Franco (1979 – 2018), Maria Chibata, Gertrudes Maria, José Marmo, Dom José Maria Pires dentre tantos/as outros/as, muitos/as anônimos/as que fizeram frente ao racismo, ao preconceito e à discriminação em nosso país. Todos/as vocês vivem em nosso corações e mentes. Vivas e vivas para Zumbi/para Dandara e para tod@s que lutam para se construir um Brasil com equidade!
João Pessoa, 20 de novembro de 2018.