A UFPB ganhou destaque na imprensa nesta quarta-feira (2/3) após o portal G1 publicar matéria revelando que o interventor Valdiney Veloso Gouveia havia sido aprovado pelo Sistema de Seleção Unificada (Sisu 2022) para o curso de engenharia de produção no instituição usando vaga destinada a estudante cotista de escola pública.
Esta seria a terceira graduação do professor, que também já possui especialização, mestrado e doutorado e ingressou no quadro da UFPB como docente no ano de 1992, chegando a professor titular, degrau máximo da carreira. A primeira formação superior dele foi concluída em 1989, em Psicologia, pela UFPB. A segunda, em 2016, em Direito, pelo Unipê, maior faculdade privada do estado.
O caso, que levanta severas questões éticas e morais, já está sendo investigado pelo Ministério Público Federal (MPF). Na tarde desta quarta-feira, a procuradora da República Janaína Andrade instaurou uma “Notícia de Fato”, solicitando da Pró-Reitoria de Graduação da UFPB uma justificativa detalhada sobre a legalidade da aprovação.
A própria ADUFPB tem recebido inúmeras manifestações de indignação e perplexidade de filiados do sindicato em relação à aprovação do professor Valdiney Gouveia. Durante todo o dia, membros da Diretoria foram procurados pela imprensa paraibana para falar sobre o caso.
Boa parte dos sites jornalísticos do estado repercutiram a notícia, a exemplo do ParlamentoPB, Portal Correio, Paraíba.com, MaisPB, ParaíbaJá e F5. O caso ganhou destaque também em programas das TVs Cabo Branco, Arapuan e Manaíra, todos com falas de diretores da ADUFPB. Também esteve em evidência na imprensa nacional, com chamada na Globonews e matéria no Jornal O Globo.
Nas redes sociais, o interventor confirmou a aprovação pelo Sisu e publicou uma foto de cópias da ficha de identificação da escola em que estudava e do certificado de conclusão do 2º grau, em 1983. Em outra postagem, nos stories do Instagram, ele desdenha da visibilidade que o caso ganhou. “Não sabia que vida pessoal de Reitor interessava a @tvglobo e ao @portalg1. Por favor, deem uma força para o meu ingresso no @bbb”, publicou.
Embora o professor não veja irregularidade em ser aprovado no Sisu para uma universidade pública, pelo sistema de cotas, mesmo já tendo uma carreira acadêmica consolidada, existem precedentes que comprovam que o fato pode ser contestado.
Em 2017, por exemplo, a 4ª Turma do Tribunal Regional Federal negou pedido de matrícula pela modalidade de cotas na Universidade Federal do Paraná (UFPR) feito por mulher que já possuía diploma de graduação. O TRF-4 entendeu que o objetivo do sistema de cotas é propiciar o primeiro acesso ao ensino superior, podendo ser dispensado das cotas aqueles que já têm formação universitária.
A decisão é semelhante a outra do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1) de 2010. Na época, um estudante que já possuía licenciatura em Química, cursava Mestrado e desejava entrar para o curso de Medicina na mesma universidade, a Universidade do Piauí (UPI).
A relatora da ação destacou que “partindo da premissa de que a reserva de vagas tem por escopo facilitar o acesso ao ensino superior de pessoas que, em decorrência de suas condições sócio-econômicas, teriam presumida dificuldade de concorrer em igualdade com os demais concluintes do 2º grau, é razoável a proibição de que àquelas que já tenham nele ingressado se valham do benefício.”
Para a ADUFPB, a legalidade do caso deve ser investigada pelas instâncias competentes, porém não restam dúvidas de que há várias questões éticas que precisam ser levantadas nesse caso.
A primeira delas é o fato de que, ao optar por concorrer pela modalidade de cotas, mesmo já tendo sido beneficiado pelo sistema de educação pública e percorrendo-o da graduação ao doutorado, o professor tira a vaga de alguém que possa estar começando a vida, vindo de escola pública, buscando a sua primeira graduação, tendo em vista a escassez de vagas disponíveis nessa modalidade.
Na avaliação da ADUFPB, o sistema de cotas é uma forma de reparação de inúmeras injustiças sociais cometidas pelo Estado e é voltado a pessoas em situação de maior vulnerabilidade. É necessário questionar, portanto, se um professor titular federal que atualmente ocupa o maior posto dentro da reitoria da instituição (mesmo que a sua indicação tenha se dado à revelia da comunidade universitária) necessita de cota para uma terceira graduação.
Fonte: Ascom ADUFPB