Como os ataques de Temer aos direitos trabalhistas reverberam na América do Sul
Não é apenas no Brasil que a contrarreforma Trabalhista, recentemente sancionada por Michel Temer, traz dor de cabeça aos trabalhadores. Em países vizinhos, como Argentina e Uruguai, o projeto brasileiro começa a ser discutido e já vira exemplo para empresários, que consideram ser necessário seguir o mesmo caminho para conseguir “competir” com o Brasil no mercado internacional.
O governo uruguaio já demonstrou publicamente sua preocupação com a contrarreforma brasileira, classificando-a como uma “forte ofensiva conservadora” que leva os direitos dos trabalhadores “de volta aos anos 90”. O Uruguai também solicitou uma reunião do Mercosul para debater o tema. Segundo o governo do país, a retirada de direitos dos trabalhadores brasileiros pode fazer com que o Uruguai tenha que fazer o mesmo para poder competir economicamente, em especial na busca por investimentos estrangeiros.
Washington Corallo, presidente da Câmara da Indústria do Uruguai, confirmou a intenção do empresariado uruguaio de seguir o caminho brasileiro e retirar direitos trabalhistas. Ele elogiou a contrarreforma de Temer e afirmou que vai contratar assessores brasileiros para formular projeto semelhante.
Dumping social
Para o uruguaio Luis Eduardo Acosta, 1º vice-presidente do ANDES-SN, é possível afirmar que, com a promulgação da contrarreforma Trabalhista, o Brasil está fazendo um processo de “dumping social”. “Dumping é baratear o custo das mercadorias utilizando meios espúrios, como a retirada de direitos dos trabalhadores. É Utilizar subterfúgios, diminuíndo o valor da força de trabalho, ignorando acordos internacionais que estabelecem níveis máximos de exploração do trabalho, para baratear custos de produção e conseguir ganhar mercados”, comenta o docente.
“A reação do Uruguai no Mercosul à reforma trabalhista brasileira explicita isso. O Brasil vai baratear sua força de trabalho a níveis absurdos utilizando a contrarreforma Trabalhista. E isso levaria os países da região a ter que utilizar, segundo o governo uruguaio, o mesmo mecanismo para disputar investimentos. Para competir com o Brasil será necessário oferecer menos proteção ao trabalhador, maior flexibilização e enfraquecer mais os sindicatos”, ressalta Acosta.
O docente uruguaio, entretanto, questiona a viabilidade dessa tese, tanto do ponto de vista da atração de investimentos estrangeiros quanto da qualidade de vida dos trabalhadores sul-americanos. Para Acosta, além de gerar um brutal processo de queda na qualidade de vida, a contrarreforma Trabalhista não garante a chegada de investimentos estrangeiros.
“É uma tentativa de relocalizar a América do Sul na ordem mundial, para tentar disputar investimentos com os países asiáticos. Mas essa ideia pode ser uma ilusão, pode ser que o mercado brasileiro não tenha condições de disputar com os países asiáticos. Os investidores podem vir, e podem não vir. Pode ser que prefiram continuar investindo em China, Vietnã, em países asiáticos que têm força de trabalho qualificada, padrão salarial muito baixo e restrição à organização sindical”, afirma o 1º vice-presidente do ANDES-SN.
Ou seja, a cartilha seguida por Temer de que para crescer é necessário investimento estrangeiro, de que para ter investimento estrangeiro é necessário dar segurança jurídica, e de que para ter segurança jurídica é necessário fazer reformas para diminuir o padrão salarial e a proteção ao trabalho, pode, além de atacar duramente os trabalhadores, não atrair nenhum investimento.
Macri quer seguir o caminho brasileiro
Do outro lado do Rio da Prata, o governo argentino tem tratado a contrarreforma de Temer como exemplo, mas espera o final das eleições legislativas, em outubro, para tentar aprovar modificações na legislação trabalhista. É o que conta o argentino Marcelo Vallina, 1º vice-presidente da Regional Norte I do ANDES-SN. Segundo o docente, o crescimento do desemprego dá condições a Maurício Macri, presidente do país, de realizar o ajuste fiscal e sua contrarreforma Trabalhista, mas a força histórica do sindicalismo argentino pode impedir a retirada de direitos.
“Até as eleições de outubro todo o processo de ajuste está parado. Mas as centrais sindicais já estão se preparando para a vinda do ajuste fiscal. Vai ser um pouco mais difícil para o governo aprovar esses projetos, pela própria conformação do Congresso, em que Macri não tem maioria, e pelas forças históricas do sindicalismo argentino”, comenta Vallina.
“Os sindicatos argentinos estão, em minha opinião, muito mais fortalecidos que no Brasil. E na Argentina você consegue, ao parar Buenos Aires, parar o país. Macri vai tentar, mas não será tão fácil retirar direitos como no Brasil. Apesar dos projetos serem parecidos, as condições são muito diferentes, já que a sociedade argentina se encontra muito mobilizada”, completa o 1º vice-presidente da Regional Norte I do ANDES-SN, citando a realização de grandes marchas e greves na Argentina durante 2017 contra as propostas de ajuste fiscal.
A proposta de contrarreforma Trabalhista argentina, baseada no projeto que Michel Temer recentemente sancionou no Brasil, é tratada apenas como um rumor pelo governo. Mas meios de comunicação alinhados a Macri, como o Clarín, já noticiaram a intenção do presidente argentino de retirar direitos dos trabalhadores.
Para Mauricio Macri, os direitos trabalhistas existentes na Argentina “impedem o país de crescer”, já que “os trabalhadores custam muito caro para os empresários”. O presidente multimilionário também critica a organização sindical, à qual atribui entraves para novas contratações de trabalhadores precarizados. Assessores do governo já afirmaram que a reforma de Temer é um exemplo para a Argentina por descentralizar a negociação coletiva, permitir contratos de trabalho precários (como o contrato de horista) e por retirar direitos de que os trabalhadores recorram à justiça do trabalho.
Marcelo Vallina conclui afirmando que a aprovação do projeto no Brasil servirá como propaganda para Macri tentar aprová-lo na Argentina. “A aprovação da Reforma no Brasil reforça o discurso de Macri. Quando uma fábrica for embora para o Brasil porque “é mais barato”, o governo vai intensificar sua propaganda. Para poder competir com o Brasil, dirão eles, temos que rebaixar direitos, reformular leis trabalhistas. Mas tenho esperança de que os trabalhadores argentinos conseguirão barrar essa contrarreforma”, afirma.
Fonte: ANDES-SN