Em 1º de maio de 1943, durante o Estado Novo de Getúlio Vargas, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) seria lançada e registraria, no código de leis do país, direitos que deveriam ser garantidos aos trabalhadores de vários setores. Mas, 70 anos depois, uma parcela considerável do empresariado brasileiro vem tentando driblar aspectos importantes da lei, sob a alegação de que essa estaria defasada para atender às demandas e necessidades atuais do país.
Um exemplo da estratégia elaborada pelos empresários – reforçada por centrais sindicais patronais e pelo governo federal – é o Acordo Coletivo Especial (ACE), proposta que prevê a sobreposição do legislado pelo acordado, ou seja: as negociações feitas entre dirigentes e patrões podem ter maior peso do que o previsto na legislação, o que abre brecha para que sindicatos que tenham gestões umbilicalmente ligadas ao empresariado contribuam para a retirada de direitos conquistados pelas categorias.
O coordenador-geral da CSP-Conlutas – Central que o ANDES-SN é filiado – José Maria de Almeida, avalia que, apesar de promover uma proteção muito aquém da necessária à classe trabalhadora, a CLT deve ser defendida perante as tentativas de retirada ou flexibilização de direitos conquistados. Para Zé Maria, “é preciso sempre reafirmar que a proteção advinda da CLT é muito limitada, deixando descobertas áreas importantes de proteção aos trabalhadores. Porém, há anos, principalmente com o advento do neoliberalismo, há uma ofensiva muito forte para que se piore ainda mais essa proteção que é dada pela CLT, conformando uma adaptação da legislação aos interesses das empresas e não dos trabalhadores”, opina o dirigente.
Segundo ele, “muitas mudanças que foram feitas nos últimos 15 ou 20 anos têm a ver com essa ofensiva neoliberal. E hoje, particularmente, temos convivido com essas ofensivas, que vão desde a reforma sindical que o governo Lula tentou implementar em 2005 – e que, na época, foi barrada pela mobilização dos trabalhadores – até a proposta apresentada pelo deputado Sandro Mabel – que possibilita a terceirização de todas as funções no interior de uma empresa -, além do projeto apresentado pelo Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, o Acordo Coletivo Especial, que, se aprovado, permitiria uma ampla flexibilização da CLT”, diz Zé Maria.
Modernização x prejuízo
O secretário-geral do Sindicato dos Bancários de Santa Maria e Região, Alexandre Soares dos Santos, diz que, embora a lei pudesse ser modernizada em alguns pontos, tais alterações teriam que vir para beneficiar os trabalhadores. “Tem muito patrão de hoje querendo modernizar, modificar a lei para prejudicar os trabalhadores, retirar direitos, como o direito a férias e ao 13º salário. Nos bancários, muitas das conquistas que temos podem ser prejudicadas pela flexibilização”, diz o sindicalista, explicando que a categoria também se mostra contrária ao ACE.
Para o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Santa Maria, filiado à CUT, Luis Mário Alejarra Coelho, o ACE poderia ser positivo se todos os sindicatos do país tivessem o mesmo potencial de mobilização. Porém, como essa não é a realidade, a proposta é problemática. “Num primeiro momento, temos uma postura contrária. Num país onde existe, inclusive, serviço escravo, qualquer tipo de negociação que possa fragilizar os direitos de trabalho é muito complicada”, afirma Coelho.
Avanços necessários
Zé Maria exemplifica algumas situações essenciais em que os trabalhadores necessitam de amparo da lei e ainda não são contemplados, como a regulamentação do direito de organização nos locais de trabalho, ainda não garantida pela CLT. “Seguimos lutando para que haja proteção contra a demissão imotivada. Hoje, 35% da mão-de-obra do setor privado é demitida todo ano. Esse mecanismo da rotatividade é usado pelas empresas para possibilitar a baixa nos salários. Então, queremos sim mudanças na CLT, mas se forem para garantir a melhoria da situação atual dos trabalhadores”, esclarece.
Outro exemplo de proteção ainda não prevista na CLT é dado pelo metalúrgico Luis Coelho, e se refere à questão da doença laboral. Segundo ele, há casos em que o trabalhador que se encontra afastado do trabalho por questões de saúde recebe avaliações diferentes do médico do Instituto Nacional da Seguridade Social (INSS)- que dá aval para que esse volte ao trabalho – e do médico da empresa – que nega este retorno, alegando que o trabalhador ainda está doente. “Aí o trabalhador tem de entrar com um recurso. E quem cuida do trabalhador nesse período? Quem paga sua conta?”, questiona Coelho. Ele referiu ainda a questão da necessidade de penalização às empresas que, por meio de seus médicos, avaliam que o trabalhador esteja capacitado para continuar trabalhando, quando este se encontra doente. Tal penalização também não está prevista na CLT.
“Se num país onde há uma legislação trabalhista reconhecida pela área jurídica ainda existem ‘n’ condições que não são cumpridas, temos que defender o que conquistamos até hoje. Temos de fazer a defesa da CLT, pois, sem ela, o que seria dos trabalhadores? Acho que ela já contribuiu e segue contribuindo muito para os trabalhadores”, avalia Coelho.
Já Zé Maria explica que a CSP-Conlutas possui uma visão crítica à CLT, entendendo que a lei é frágil e não garante toda a proteção necessária à classe trabalhadora. Entretanto: “esse contexto político em que vivemos é o que nos leva a hoje, apesar de termos uma visão crítica da CLT, defendê-la contra essas ofensivas, pois são mudanças que não melhorariam as condições que temos hoje, trariam uma situação pior que a atual”, conclui o dirigente.
* Com edição do ANDES-SN
Fonte: Sedufsm Seção Sindical