Na última quarta-feira, dia 1º de abril, os servidores públicos começaram a sentir intensamente os efeitos da Emenda Constitucional 103/2019, a “reforma” da Previdência do governo Bolsonaro. Aprovada em novembro do ano passado, o texto prevê, entre outros pontos, mudanças nas alíquotas de contribuição do funcionalismo que passam a ser percebidas agora, no pagamento do mês de abril, depositado neste dia 1º.
O alerta que os sindicatos fizeram ao longo de todo o processo de tramitação da EC 103 se concretizou e milhares de trabalhadores estão sentindo em seus orçamentos o peso do confisco salarial do governo. Segundo calculos divulgados pelo Andes – Sindicato Nacional, a redução nas remunerações pode variar de R$ 170 a até cerca de R$ 770.
Sobre esse tema, o professor Marcelo Sitcovsky, do Departamento de Serviço Social, preparou um artigo em que faz um alerta: “continuamos sendo assombrados por mais medidas e propostas que pretendem ampliar o confisco salarial”. O quadro atual ainda pode piorar, por exemplo, com a “reforma” administativa, ameaça o bom funcionamento do serviço público, e medidas emergenciais que se utilizam da trágica situação de pandemia em que o mundo se encontra para fragilizar ainda mais o funcionalismo.
Frente a esse quadro, a ADUFPB reforça a importância da mobilização da categoria. Mesmo com o isolamento social em decorrência da pandemia do coronavírus, é necessário que todos e todas estejam alertas e cientes da necessidade de reforça a luta para barrar a sequência de ataques contra o setor público e contra a Educação.
Confira abaixo o artigo do professor Marcelo Sitcovsky:
Confisco de salários: ontem e o amanhã?
A difícil conjuntura que enfrentamos certamente tem exigido muito de todos(as) nós, pois são tarefas via teletrabalho que alteram muito nossa dinâmica de trabalho, tarefas domésticas que se ampliaram e se complexificaram – são nossas próprias demandas, de nossos filhos e/ou idosos -, tarefas reprodutivas no interior das famílias que igualmente alteraram profundamente nossas vidas.
A necessidade de isolamento social – destaco, condição indispensável para atenuar os efeitos devastadores da pandemia no estrangulamento do sistema de saúde em todo mundo – tem de fato produzido grandes efeitos sobre nossas vidas. Além de tudo, temos que estar atentos à saúde mental de todos que estão conosco nesta empreitada, estejam eles dividindo o mesmo local ou em locais diferentes. Muita solidariedade tem sido demonstrada, mas também é possível observar atitudes repugnantes, sendo que estas sequer merecem ser detalhadas e repetidas.
Mas o motivo para essa postagem de hoje, 01 de abril de 2020, não é aproveitar o clima e fazer uma brincadeira. O que me motivou escrever é que hoje os servidores federais receberam seus salários.
Eu costumava dizer, antes dessa tragédia da pandemia, que hoje seria uma data muito importante e que muitos procurariam seus sindicatos para entender o que aconteceu com seus salários. A partir de hoje, passa de fato a vigorar e a serem sentidos os efeitos da “reforma” da previdência, aprovada no ano passado. Aquela “reforma” em que Bolsonaro e Paulo Guedes aplicaram várias novas regras e uma delas foi exatamente promover um confisco salarial dos servidores públicos federais, e que estados e municípios “terão/tiveram” que seguir.
O aumento das alíquotas de contribuição para previdência social foi justificado por tabelas fraudadas e por uma perversa ideologia que ganhou inúmeros adeptos. Refiro-me à ideia de que os servidores públicos ameaçam as contas públicas e, junto com as políticas sociais, estão quebrando o país.
Os salários dos servidores públicos sofreram confisco com a “reforma” da previdência e, desde o final do ano passado, continuamos sendo assombrados por mais medidas e propostas que pretendem ampliar o confisco salarial.
Não satisfeito, o governo que não abriu mão da “reforma” administrativa – apenas teve que coloca-la na geladeira, já que o país foi inundado pela COVID19 – tenta a todo custo arrumar uma forma/manobra para aplicar seus sórdidos objetivos de destruição dos serviços e de extermínio dos servidores. Afinal a sociedade não precisa de serviços públicos, apenas os essenciais, todo resto pode ser oferecido nas prateleiras do mercado – o velho mantra neoliberal – que a realidade do Coronavírus tem transformado em poeira.
Circulam nos corredores virtuais do Congresso Nacional a retomada de medidas restritivas que, desta vez, estariam motivadas pela necessidade do Estado brasileiro investir em ações contra a pandemia e seus efeitos econômicos.
O governo já deu a senha, os jornais seguem produzindo editoriais e rapidamente os especialistas de plantão dirão que não há outro caminho, já que as propostas de aumento do déficit público não podem sequer especular a possibilidade de suspender o pagamento da dívida, pois se assim o fizerem receberão os castigos do Deus Mercado.
Há saída sim!
E a saída não passa pela ameaça de confisco aos assalariados, sejam eles público ou privados.
Taxar as grandes fortunas e suspender o pagamento da dívida já pode ser um começo.
Volto ao que me motivou escrever hoje essas rápidas e nada sistemáticas linhas: o confisco de salário já aconteceu!
Marcelo Sitcovsky
Prof. do Departamento de Serviço Social da UFPB