Para meu ex-aluno Tiago Silva, que se deixou encantar por Elizabeth Bishop e em nome de quem homenageio todos os meus ex-alunos
Vitória Lima
Sim, fui e sou professora, desde muito cedo na vida. Tinha quinze anos quando comecei a dar aulas de inglês. Não tinha intenção de ser professora, mas quando me vi numa sala de aula, rodeada de jovens, alguns até mais velhos que eu, senti-me bem. Uma profissão que combinava com meu lado leonino de estar no mundo.
Fui me encaminhando na profissão e, como consequência inevitável, dirigi-me para o curso de Letras. E gostei. E nele fiquei. E fiz concurso para professora de UFPB, só que não sabia na época que ser Auxiliar de Ensino ainda não era ser professora. E saí do país para fazer Mestrado e prestei outro concurso para Professor Assistente, quando voltei para a UFPB.
Cumpri meu tempo de serviço lá, aposentei-me, mas minha carreira ainda não estava finda. Alguns anos depois prestei novo concurso, desta vez para a UEPB, que fora minha primeira casa de ensino superior, na época com outro nome: FURNE. Lá fiquei por 10 anos, até que minha coluna começou a dar sinais de cansaço e tive que parar. Nova aposentadoria.
Dessas duas experiências como professora universitária ficaram-me as melhores lembranças e a certeza que não poderia ter escolhido outra profissão. Como professora pude viajar, conhecer pessoas, trocar conhecimentos e afetos com as mais diversas pessoas, adquirir conhecimentos, alargar horizontes, tornar-me a pessoa mais abrangente, calorosa, realizada que sou hoje.
Como mãe, também aproveitei muito do aprendizado que fiz como professora. E ainda continuo aprendendo, e ensinando, como avó que sou.
No meu ofício de escritora uso muito do que aprendi e ensinei. Sempre há alguém me dando respostas sobre isso, embora minha responsabilidade seja menor, uma vez que não estou participando, formalmente, da formação profissional do outro. Só colaborando, de alguma forma, continuando minha trajetória de formadora de opinião, sem sair de casa, só usando o computador e as redes.
E é assim que quero continuar minha vida. Dando minha contribuição como cidadã que sou, grata por tudo que me foi repassado por meus pais e mestres ao longo de toda uma vida, que já se estende por mais de setenta décadas.
Como a poesia é o meu mais definido Norte, quero encerrar este texto comemorativo do dia do professor com um poema da poetisa norte-americana Elizabeth Bishop, (1911-1979) que me ensinou muito e transmitiu muita sabedoria. Bishop tem uma significação bem especial para nós brasileiros por ter vivido parte da sua vida no Brasil, por ter amado este país e ter tido uma profunda experiência amorosa com uma arquiteta brasileira. Transcreverei o poema no original inglês, para os que leem nessa língua possam apreciar sua sonoridade original e na tradução de Paulo Henriques Britto, em português do Brasil:
One Art Uma Arte
The art of losing isn’t hard to master, A arte de perder não é nenhum mistério
so many things seem filled with the intent tantas coisas contêm em si o acidente
to be lost that their loss is no disaster. de perdê-las, que perder não é nada sério.
Lose something every day. Accept the fluster Perca um pouquinho a cada dia. Aceite, austero,
Of lost door keys, the hour badly spent. a chave perdida, a hora gasta bestamente.
The art of losing isn’t hard to master A arte de perder não é nenhum mistério.
Then practice losing farther, losing faster Depois perca mais rápido, com mais critério:
places, and names, and where it was you meant lugares, nomes, a escala subsequente
to travel. None of these will bring disaster. da viagem não feita. Nada disso é sério.
I lost my mother’s watch. And look! my last, or Perdi o relógio de mamãe. Ah! E nem quero
next-to-last, of three loved houses went. lembrar a perda de três casas excelentes.
the art of losing isn’t hard to master. a arte de perder não é nenhum mistério.
I lost two cities, lovely ones. And vaster, Perdi duas cidades lindas. E um império
some realms I owned, two rivers, a continent. que era meu, dois rios e mais um continente.
I miss them, but it wasn’t a disaster. Tenho saudade deles. Mas não é nada sério.
–Even losing you (the joking voice, a gesture Mesmo perder você (a voz, o riso etéreo
I love) I shan’t have lied. It’s evident que eu amo) não muda nada. Pois é evidente
the art of losing’s not too hard to master que a arte de perder não chega a ser mistério
though it may look like (Write it!) like disaster por mais que pareça (Escreve!) muito sério.
Este poema foi originalmente publicado na revista New Yorker, em abril de 1976 e com ele quero saudar todos os meus colegas de profissão e ex-alunos.