Já está circulando a nona edição do jornal Em Tempo, uma publicação da ADUFPB que tem o objetivo de contribuir para o debate e as ações de resistência e mobilização nas universidades e no país. Esta edição traz artigo do professor Alexandre Náder, do Departamento de Habilitações Pedagógicas da UFPB, intitulado “Brasil: o medonho minueto que se dança para 2022”.
No texto, ele associa o governo Bolsonaro à implementação de uma “Tanatocracia”, em referência ao deus mitológico Tânato, a personificação da morte. Para Náder, “entramos, aqui no Brasil, num intervalo-síntese desse processo de ascensão da morte ao poder, com os acontecimentos do dia 7 de setembro e aquilo que deles se desdobrou, e que irá, a meu ver, até as eleições presidenciais de 2022”.
Para ler o texto completo, basta acessar o site da ADUFPB (www.adufpb.org.br) ou solicitar o jornal em formato PDF pelo Whatsapp da assessoria de comunicação (99645-7000). A edição também é enviada por e-mail para todos(as) os(as) docentes cadastrados(as) na nossa lista de distribuição.
Leia abaixo o texto na íntegra ou clique aqui para fazer o download em formato PDF.
Brasil: o medonho minueto que se dança para 2022
Alexandre Náder
Professor do Departamento de Habilitações Pedagógicas do Centro de Educação – UFPB
Nem tenho muita certeza de que este texto se encaixa no perfil editorial do “Em Tempo”. A característica central de uma análise, dos textos anteriormente aqui publicados, não é, certamente, um dos seus atributos. No entanto, em defesa de sua inserção neste veículo, penso que ele (se) trata de uma leitura da atual conjuntura brasileira. Uma leitura que, como se verá, por seu conteúdo, revela e explicita uma percepção dessa referida conjuntura que transita por um outro território que não só o da razão – daí porque não ouso classificá-lo como analítico. Só não posso deixar de fazer um alerta. Mesmo falando de sentimentos e sensações, o que ainda não aconteceu não é história, é possibilidade. O que escrevo é o que vejo como possibilidade, no momento, mais provável.
Desde há algum tempo, um dos aspectos que têm, para mim, sobressaído da política que se pratica em nosso país é a sua feiura. A despeito de esforços, poucos deles bem sucedidos, de um lustre para os dias de hoje, mais ou menos, aquilo que ocorre na política brasileira tem sido marcado, predominantemente, pela mesquinharia, pela esperteza miúda, por um jogo sujo que põe em conluio baixezas e interesses movidos por avidezes quase ilimitadas. Não é que essas coisas não tivessem tido seu lugar na política brasileira anteriormente. Mas – será isso uma ilusão minha? – havia menos exacerbação e uma razoável dose de pudor em sua exibição. Em outros tempos, isso permanecia mais à sombra, menos evidenciado, e, quando se tornava mais aparente ou intenso do que o considerado adequado, um número significativo de vozes levantava-se em protesto.
Não sou um ingênuo a ponto de achar que uma abordagem internalista desses aspectos seja capaz de torná-los completamente compreensíveis. Mas valendo-me de leituras feitas, entre outras, das reflexões dos autores que me antecederam neste “Em Tempo”, como forma de atestar que percebo os vínculos que eles têm com outras dimensões da existência humana, vou me permitir continuar perseguindo o veio que adotei inicialmente.
Essa feiura que aqui denuncio tem como pressuposto – e, também, como finalidade (ah, a danada da circularidade na relação entre causa e efeito!) – a implementação de algo que estou nomeando de Tanatocracia, ou a morte no poder, nas variadas acepções e dimensões que isso possa assumir. Vejam só, vou fugir um pouco da(o) permissão/compromisso assumida(o) logo acima: penso ser esta uma das possíveis formas de expressar as características mais emblemáticas do estágio atual do capitalismo-mundo.
E acredito que entramos, aqui no Brasil, num intervalo-síntese desse processo de ascensão da morte ao poder, com os acontecimentos do dia 7 de setembro e aquilo que deles se desdobrou, e que irá, a meu ver, até as eleições presidenciais de 2022. A nitidez dada por Bolsonaro ao seu esforço de implementação do projeto tanatocrático (?), à sua moda – ele quis tomar o freio nos dentes e falhou, não conseguiu… em resumo, pelo menos, no imediato, perdeu – , à revelia de seus mentores, foi exagerada, considerada over pelos maiores interessados na concretização desse projeto. É preciso envernizar – ou, usando uma palavra bastante da moda, “gourmetizar” – o projeto, tornando-o mais palatável para aqueles que, afinal de contas, têm algum poder decisório em suas mãos: os que votam.
Não é outro o propósito da chamada “busca pela terceira via”, da construção da falsa equivalência (os dois lados da mesma moeda…) entre Lula e Bolsonaro. Aliás, caracterizar Lula e, também, o PT, em termos do viés aqui privilegiado, seria importante, mas não irei fazê-lo: falta de tempo/espaço e medo de perder o foco. Sigamos adiante, então. E, para o êxito global da empreitada, é preciso, ainda, uma contradança que atenda ao “mito”, como estratégia de minimização de riscos, já que ele ainda dispõe de um conjunto considerável de seguidores fiéis. Afinal de contas, ele foi posto no lugar em que está, sobretudo, por aqueles que hoje tentam a tal terceira via, condensados, simbolicamente, em sua expressão política, na figura de e no papel desempenhado por Michel Temer. Isso significa, provavelmente, assegurar um injustíssimo indulto à famiglia Bolsonaro, cappo incluído, para todos os crimes cometidos. Impeachment, então, nem falar – pelo menos, por agora. E, assim, por tudo isso, a feia contradança torna-se um medonho minueto. Horroroso. Macabro.
Esse é o quadro – desolador, para o meu coração – em que nos encontramos hoje. Esse mesmo coração mantém uma esperança – tênue, mas ativa, na busca de ampliar-se – de que meus olhos possam ser presenteados, num futuro bem próximo, com visões menos horrendas, mais alvissareiras. Ou, pelo menos, brindados com mediações para elas… Torçamos e façamos por isso!
Fonte: Ascom ADUFPB