Jaldes Reis de Meneses
Acabei de ler dois livros antagônicos recém-lançados no mercado curiosamente pela mesma editora (Três Estrelas), demonstrando que o dinheiro desconhece diferenças ideológicas: o primeiro do filósofo Vladimir Safatle – A esquerda que não teme dizer o nome – e o segundo, reunindo depoimentos de João Pereira Coutinho, Luiz Felipe Pondé e Denis Rosenfield – Por que virei à direita.
Com formação de esquerda, compartilho do mesmo campo ideológico de Safatle (embora discorde de muitas de suas teses), mas conheço bem a tradição do pensamento conservador moderno, infelizmente pouco estudado nas universidades brasileiras. Costumo dizer em sala de aula que o conservadorismo é uma espécie de pensamento carrapato.
O pensamento conservador na essência é polêmico e fechado. Ao contrário do que se pensa, nem todo pensamento polêmico é aberto. Desde quando Edmund Burke publicou em 1790 publicou o clássico “Reflexões sobre a revolução na França” (a pia batismal do conservadorismo), criticando a noção de direitos do homem do iluminismo invocando o santo nome dos costumes, que esta escola requisita de um corpo para parasitar. Não há conservadorismo sem a ideia da revolução, que lhe antecede e dá a razão de existir.
No livro dos direitistas brasileiros, a veia polêmica do conservadorismo continua afiada, todavia acompanhada do doutrinarismo histórico. Pessimistas, o ideal de homem do conservadorismo cinge-se a reiterar o passado. Nada de novo do front da política e da cultura, senão contemplar o grande hotel do abismo. Parafraseando o poeta Manuel Bandeira, não quero sabe de poesia que não seja libertação.
Mudando o diapasão, minha diferença com Vladimir Safatle reside precisamente no conceito de liberdade. O filósofo prega em seu novo livro a defesa de um “igualitarismo” radical, no qual a luta contra a desigualdade social e econômica submete todas as demais. Na verdade, Safatle recua de Marx e está a propor no século XXI uma renovação do jacobinismo. Existe um equívoco muito difundido – que Norberto Bobbio ajudou a espalhar – de que o valor decisivo da esquerda é a igualdade. Engano. O grande valor presente, ao menos na obra de Marx, é a liberdade, de onde ele parte para fazer a crítica da propriedade privada (questão ausente no livro de Safalte) e formular o projeto do comun ismo. Recriando Bandeira: só quero saber de política que seja libertação.