Quem participou da audiência pública realizada na tarde dessa terça-feira (5), na Câmara dos Deputados, para debater a Medida Provisória 568/12, surpreendeu-se com uma situação, no mínimo, esdrúxula. Os líderes do governo na Câmara e no Senado estavam lá para reconhecer que a MP 568 continha erros e que estes seriam corrigidos. A audiência, realizada no auditório Nereu Ramos, foi acompanhada por mais de 200 pessoas, entre médicos e demais servidores públicos, que lotaram o espaço.
“Participo de audiências públicas há muito tempo e nunca tinha visto nada parecido”, afirmou o 1º vice-presidente do ANDES-SN, Luiz Henrique Schuch, que representou o Sindicato Nacional no evento. Os representantes do governo se comprometeram a mudar a parte da MP que aumentou a carga horária de trabalho dos médicos e veterinários do serviço público federal de 20 para 40 horas semanais, o que reduziu os salários pela metade, congelando a diferença sob a forma de VPNI. Os dois não demonstraram a mesma firmeza, no entanto, ao tratar da solução para o problema criado com as modificações introduzidas, às escusas do processo negocial, nos adicionais de periculosidade e insalubridade.
Para o líder do governo na Câmara dos Deputados, Arlindo Chinaglia (PT/SP), a redução no salário dos médicos foi “um grande equívoco”. Disse, ainda, que o governo está procurando uma forma de sair “dessa situação perversa”,para que os médicos e veterinários “não percam um centavo em seus vencimentos”.
Já o líder do governo no Senado Federal, Eduardo Braga (PMDB/AM), que também é relator da MP 568/12 na comissão mista que analisa a proposta, disse que foi escolhido para relatar a MP porque o governo entendia ser necessário “corrigir alguns problemas”. Disse, também, que não era certo o movimento de derrubar a medida provisória. “Queremos fazer o que for melhor, dentro das nossas possibilidades, para não ferir direitos”, afirmou.
Braga criticou, ainda, o fato de a MP 568/12 tratar de várias categorias ao mesmo tempo. “No afã de querer muitos problemas represados, ela acabou por criar outros”, disse. Disse, ainda, que se hoje os adicionais de insalubridade e periculosidade são complementos salariais é porque o salário é baixo.
Vício de origem
Em sua fala, o 1º vice-presidente do ANDES-SN, Luiz Henrique Schuch, lembrou que a origem de todos os problemas causados pela MP 568/12 está no desrespeito do governo ao mandamento constitucional que assegura reajuste anual de vencimentos para os servidores. “Se, ao invés de ficar usando re-estruturações para conceder aumentos salariais para carreiras específicas, o governo trabalhasse coma revisão geral assegurada na lei maior, não teríamos os problemas que estamos tendo agora”, afirmou.
Outro ponto apontado por Schuch foi a burla que será a transformação dos adicionais e periculosidade e insalubridade em VPNI (Vantagem Pessoal Nominalmente Identificada). “Na verdade, essa é mais uma forma encontrada pelo governo para promover um retrocesso social e congelar salários”, denunciou.
Um terceiro problema está na determinação, constante nas três últimas Leis de Diretrizes Orçamentárias (LDO), que engessa a política de re-estruturação de carreira e reajuste salarial, que só podem ocorrer se previstas em projeto de lei iniciado, no máximo, até 31 de agosto de um ano para valer no seguinte. “Por que um artigo odioso como esse não vale, também, para as isenções e renúncias dadas às empresas?”, questionou o diretor do ANDES-SN.
Schuch defendeu, ainda, a necessidade de encontrar uma forma jurídica para que sejam respeitados os acordos e resolvidos os problemas criados pela MP 568/12. “Caso essa solução não seja encontrada, será o limite da perda de credibilidade do que o governo chama de negociação. Se ele não consegue cumprir os acordos pequenininhos, como os feitos com algumas categorias ano passado, como poderemos acreditar que outros serão cumpridos?”, indagou. “É preciso encontrar uma equação para que esses pequenos ganhos sejam mantidos e que o conjunto das mazelas da MP sejam retirados”, defendeu.
Acordo
Autora do requerimento para a realização do debate, a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) disse estar confiante no acordo. “O relator está construindo soluções técnicas e jurídicas para fazer um relatório que não seja questionado juridicamente. Eu acredito não só na vontade política, mas na grande possibilidade de a gente conquistar a supressão de tudo aquilo que hoje prejudica os médicos e outros servidores”, disse.
Jandirai integra a comissão mista que analisa a matéria. Ela argumentou, no entanto, que é preciso manter os ganhos salariais que outras categorias conseguiram com a proposta do Executivo. O relator-revisor da medida, deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR), disse que o governo reconheceu o erro. “Não é esse o objetivo da MP. Há o compromisso de evitar perdas”, afirmou.
Alice Portugal (PCdoB-BA), que também propõe o debate, disse que a MP é apenas a continuidade de uma política do governo federal de redução e contenção salarial. “Estão cedendo às pressões do mercado, que vê os servidores como gasto”, afirmou. A deputada argumentou que o corte pela metade dos salários de médicos e veterinários faz parte de uma política deliberada do Palácio do Planalto de enfraquecer a saúde pública e fortalecer entidades como as organizações sociais e a Ebserh. “Eles querem que vocês (médicos) deixem o sistema público para que ele morra e terceirização disfarçada se torne a única saída”, afirmou.
Nova medida
O presidente da Comissão de Seguridade Social e Família, deputado Mandetta (DEM-MS), defendeu que a MP 568 seja totalmente descartada para que se comece do zero. “Quando estamos esperando avanços, o governo vem com essa medida cínica, hipócrita, covarde, sem diálogo com ninguém e reduz salários. Isso foi a gota d’água”, criticou.
Segundo o presidente da Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público, deputado Sebastião Bala Rocha (PDT-AP), a comissão foi surpreendida pela MP, já que existe um projeto de lei sobre o mesmo tema em discussão na Câmara (PL 2203/11). “Também fomos surpreendidos por algumas maldades no texto, em especial a redução de salário de algumas categorias, proibida pela Constituição”, afirmou.
Integrante da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, Chico Alencar (Psol-RJ) também prometeu empenho na defesa da rejeição da MP. “Essa MP comete um crime. Retirou quase metade do salário de muitos que estão aqui”, destacou.
SUS enfraquecido
O presidente da Federação Nacional dos Médicos, Cid Carvalhaes, considerou que a medida enfraquece o Sistema Único de Saúde (SUS) e desrespeita a saúde dos brasileiros. Ele afirmou que não há nenhum estímulo para os médicos permanecerem no serviço público, que “é um sacrifício muito grande”. Ele avisou que a medida pode fazer com que os profissionais peçam demissão do serviço público, provocando uma desassistência extremamente grave já dentro de uma “situação caótica” que a saúde brasileira vive.
O debate dessa terça-feira foi promovido pela comissão mista criada para analisar a MP, em conjunto com as comissões de Seguridade Social; de Trabalho; e de Direitos Humanos.
Com informações da Agência Câmara
Foto maior: Beto Oliveira – Agência Câmara
Fonte: ANDES-SN