Antes de iniciar a subida da serra que leva ao município de Areia, o viajante passa pela lagoa que margeia o centro da cidade de Alagoa Grande, atravessa um estreito corredor comercial, segue pela praça em frente à igreja matriz e, depois de alguns metros, chega a um prédio de minúsculos ladrilhos verdes, onde se lê uma placa: Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Alagoa Grande.
Em seu interior, destacam-se fotos de lideranças históricas da entidade — Maria da Penha Nascimento Silva, Severino Casemiro e, claro, Margarida Maria Alves, símbolo da luta pela reforma agrária e contra a violência no campo e a exploração dos camponeses. Direitos como a jornada de trabalho de oito horas e o 13º salário — que, para alguns trabalhadores rurais de Alagoa Grande e região, podem parecer algo natural —, foram conquistados por meio da luta organizada pela sindicalista. Isso foi suficiente para atiçar a ira de neo-senhores de engenho locais e promover o seu assassinato, em 12 de agosto de 1983. Quarenta anos depois, os envolvidos no episódio ainda não foram punidos.
No último domingo (26), para encerrar a Semana Pedagógica Margarida Alves, que marcou os 90 anos de nascimento e os 40 anos do assassinato da líder camponesa, mulheres e homens do campo, da cidade, da política e de diversos movimentos sociais, organizações, associações e sindicatos realizaram uma marcha que saiu da casa onde ela viveu e morreu até a Igreja Matriz Nossa Senhora da Boa Viagem, na qual se celebrou uma missa em sua homenagem. A homilia, marcada por forte reflexão sobre a atual conjuntura e o espaço da fé nos dias atuais, antecedeu a distribuição de flores representando pequenas margaridas, que coloriram o caminho percorrido pelos participantes até o palco montado em frente ao sindicato.
O som da viola e os versos de Soledade, artista regional consagrada, encerrou a programação do evento, realizado pelo Movimento da Mulher Trabalhadora da Paraíba (MMT-PB). A ADUFPB, uma das entidades que estiveram presentes, foi representada por seu presidente, Cristiano Bonneau; pela suplente da Secretaria Adjunta da ADUFPB em Bananeiras, Iranice Muniz; e pelas diretoras de Política Educacional e Científica, Ivete Martins; de Política Sindical, Valdenilza Ferreira; e de Política Social, Anita Pereira — que enalteceu as escolas locais, por inserirem a história de lutas de Margarida em seus planejamentos pedagógicos.
A deputada estadual Cida Ramos, base da ADUFPB e três vezes presidenta desse sindicato, também participou da solenidade. Em sua fala, ela fez uma espécie de “diálogo” com a líder sindical assassinada, salientando que a luta que lhe tirou a vida permanece viva nas atividades sindicais e na trajetória de cada um dos presentes.
Heroína – Quatro décadas depois do seu assassinato, Margarida Maria Alves teve o seu nome gravado no Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria. A proposta, da deputada federal Maria do Rosário (PT-RS), foi aprovada pela Câmara Federal, sancionada pelo presidente Lula e publicada no Diário Oficial da União (DOU), no dia 17 de agosto passado.
O evento realizado pelo MMT-PB em Alagoa Grande aconteceu entre os dias 21 e 27 de agosto. Contou com atividades nas escolas, na Casa Museu Margarida Maria Alves e no Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Alagoa Grande. “Esta Heroína da Pátria é referência da luta contra as violências do campo e por justiça social. Presente e viva na luta de todos nós, ela teve uma justa e necessária homenagem em sua cidade natal”, disse o professor Cristiano Bonneau.
Marcha – A trágica história da líder sindical ganhou amplitude nacional com a Marcha das Margaridas, evento realizado a cada dois anos, em Brasília-DF, no qual mulheres de diversos movimentos sociais marcham até a capital federal e prestam homenagem à memória da líder sindical e contra a pobreza, a fome e a violência sexista. A marcha denuncia o difícil processo de reforma agrária no Brasil e revela o quanto a justiça social está distante, mesmo diante do assassinato e da criminalização dos trabalhadores que não se negam a reivindicá-la.