O Ministério da Educação publicou uma nota técnica que modifica as normas para a escolha dos reitores das instituições federais de ensino superior. Divulgada em 17 de dezembro, a Nota Técnica nº 400 substitui a 437, de 2011, que possibilitava as consultas informais à comunidade acadêmica sobre o pleito.
Entre as mudanças está a exclusão da possibilidade da escolha de reitores ser feita de maneira paritária e do candidato derrotado retirar seu nome da lista após a votação. “[A] votação paritária ou que adote peso dos docentes diferente de 70% será ilegal, e deve assim ser anulada, bem como todos os atos dela decorrentes”, diz a nota.
Segundo Antonio Gonçalves, presidente do ANDES-SN, a mudança imposta pelo MEC é um ataque à autonomia universitária e a democracia interna. “Nós já temos críticas à lista tríplice e ao modelo de eleição indireta que ocorre hoje nas instituições. Nós lutamos ao longo dos anos para ampliar a democracia nas universidades. Essa nota vem para cercear o mínimo de democracia que tínhamos. O Sindicato defende a eleição direta dentro da universidade com o voto paritário ou universal, conforme a autonomia de cada instituição”, disse.
Atualmente, o artigo 207 da Constituição Federal garante a autonomia universitária e a Lei 9.192/1995 estabelece que o presidente da República indique o reitor baseado numa lista tríplice. A mesma Lei e o Decreto 1916/1996 sustentam o mínimo de 70% de participação de membros do corpo docente em sua composição. Em geral, por meio do ministério da Educação, o governo federal respeita a decisão da comunidade acadêmica, escolhendo como reitor o primeiro colocado desta lista.
Gonçalves explica que apesar das limitações, a nota técnica de 2011 previa o respeito aos processos democráticos internos conquistados por docentes, técnicos e estudantes. Em algumas instituições, por exemplo, através das consultas, era garantida a paridade entre os três segmentos (33,3% dos votos) para a escolha do reitor. Em outras, havia a possibilidade dos candidatos que perdiam o pleito retirarem seus nomes da lista tríplice.
Dessa forma, não haveria a possibilidade de o governo interferir no resultado das urnas. De acordo com a Folha de São Paulo, um estudo da Universidade de Brasília (UnB), de 2012, mostrou que 37 das 54 federais usavam o sistema paritário.
Em nota enviada às Seções Sindicais em 21 de dezembro de 2018, a Assessoria Jurídica Nacional (AJN) do Sindicato Nacional ressaltava: [a Nota Técnica] expressa “que o resultado da consulta à comunidade universitária não vincula a deliberação do colegiado máximo das Ifes, vez que a elaboração da lista tríplice é de competência exclusiva deste órgão”.
De acordo com a AJN, apesar dessa orientação já constar na legislação que regulamenta o processo de escolha dos dirigentes das Ifes, a “Nota Técnica, pode sinalizar uma pré-disposição governamental de que eventuais processos de escolha que não sigam essas determinações possam ser inquinados de ilegalidade e, portanto, passíveis de anulação”. Confira aqui a nota da AJN.
Ines
Na última semana, o ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez, ignorou a decisão da comunidade acadêmica na escolha do novo diretor-geral do Instituto Nacional de Educação de Surdos (Ines). O ministro indicou Paulo André Martins Bulhões, que ficou em segundo lugar na eleição interna.
A Associação dos Servidores da Ines (Assines, filiada ao Sinasefe) divulgou uma carta aberta na qual criticou a decisão de Vélez Rodrígues. Cobrou, também, que seja “respeitado o resultado do processo eleitoral realizado no instituto, em novembro de 2018, com ampla participação da comunidade escolar”. A Assines ressaltou ainda que todos os candidatos assumiram o compromisso de que não tomariam posse caso não vencessem a eleição interna.
É a primeira vez que o primeiro colocado na eleição no Ines não é o nome escolhido pelo ministério da Educação. O regimento do Ines determina que o diretor-geral do instituto, com mandato de quatro anos, seja eleito por meio de lista tríplice.
Alerta
O presidente Jair Bolsonaro (PSL), ao longo dos seus quatro anos de mandato, poderá escolher os reitores de 11 universidades federais, segundo a Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior no Brasil (Andifes). Antes de ser eleito, no pleito realizado em 2018, Bolsonaro e sua equipe já sinalizavam a interferência direta na escolha dos reitores nas universidades federais.
A preocupação da categoria docente é que a nota técnica seja uma abertura ainda maior para os ataques a autonomia universitária. “A luta era para superar a lista tríplice e, agora, estamos vivendo um retrocesso com a nota técnica do Temer, com a perspectiva de um aprofundamento dos ataques com as intenções de Jair Bolsonaro para as universidades”, disse o presidente do Sindicato Nacional. Para ele, analisando as declarações recentes, o novo governo sinaliza uma mudança que poderia até ser a indicação direta para os cargos de reitores.
“A universidade é um polo de resistência. As IES federais são campos de resistência. Sucessivos governos tentam controlar para sufocar e monitorar a produção de conhecimento. Essa nova forma de escolha dos dirigentes visa cercear os direitos de livre expressão, a democracia e a autonomia das IES”, concluiu o presidente do ANDES-SN.
Fonte: Andes-SN
*Com informação da Folha Dirigida. Imagem: Divulgação/MEC