A ADUFPB publica nesta quinta-feira (25) um boletim com nota do sindicato a respeito do processo de intervenção na reitoria da UFPB. O texto analisa os efeitos desse ataque à autonomia universitária, além da atuação da vice-interventora e do procurador da UFPB na audiência realizada no dia 16 de maio para tratar do dossiê que pede a destituição do interventor e de sua vice. Também convoca a comunidade universitária a participar da nova audiência do Conselhão para tratar desse assunto, que ocorrerá na segunda-feira, 29 de maio.
Leia a nota da ADUFPB abaixo ou faça download do boletim em formato pdf clicando aqui.
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O PODER DOS CONSELHOS SUPERIORES USURPADO PELO PROCURADOR DA UFPB
A UFPB e sua comunidade também são vítimas de uma das inúmeras faces de um modo perverso de gestão do poder denominado lawfare. Em síntese, esse processo pode ser compreendido como a ação deliberada de agentes públicos do judiciário e de áreas correlatas que, em nome de suas atribuições, operam politicamente e extrapolam as suas competências, ao subtrair direitos e usurpar poderes legítimos de indivíduos eleitos, conselhos representativos e outras estruturas colegiadas que promovem a gestão de instituições públicas brasileiras. Esse modo arbitrário de intromissão jurídica, que instrumentaliza procedimentos legais com vistas à intimidação, ao combate ou à eliminação de adversários, mina a democracia e empodera agentes públicos que não possuem legitimidade ou representatividade política para o exercício da governança.
Em espaços eminentemente autônomos e democráticos, como é o caso das universidades federais brasileiras, a atuação política de agentes jurídicos associados ao lawfare tem tido consequências devastadoras. No caso específico da UFPB, atualmente administrada por uma reitoria não escolhida pela comunidade universitária, a não representatividade dos dirigentes se explicita na falta de competência para a gestão democrática, assim como nas formas arbitrárias e abusivas de condução dos processos administrativos. Para além dos malabarismos retóricos do atual interventor e da vice-interventora — que se esforçam, perante a mídia convencional, para dar a entender que tudo vai bem na instituição, enviando mensagens pelas redes e tentando convencer a Paraíba e a própria comunidade acadêmica de uma pretensa normalidade na ordem vigente —, seja qual for o critério adotado para mensurar os efeitos de uma administração interventora numa instituição em tudo gerida por instâncias colegiadas e conselhos representativos, as implicações serão sempre negativas, senão funestas, e as contradições cada vez mais evidentes.
Essas contradições se intensificam e assumem proporções inaceitáveis nas reuniões dos Conselhos Superiores, justamente pelo poder de que estão investidos. Ao assumirem a gestão sem o aval da comunidade universitária, o interventor e sua equipe atestaram publicamente sua falta de comprometimento com as instâncias institucionais democráticas, esquecendo-se talvez de que essas instâncias ordenam, em grau superior, o funcionamento da própria universidade. É daí que se originam o recorrente recurso ao arbítrio e o exercício acrobático de manipulação da ordem por parte da gestão. À disposição desse reitorado intervencionista, destaca-se o papel do procurador-geral da UFPB, buscando e rebuscando meios jurídicos de defender o indefensável, de justificar o injustificável.
E aqui retomamos a menção ao lawfare, ao tratarmos do ocorrido na última reunião conjunta dos três conselhos superiores da UFPB — Consuni, Consepe e Conselho Curador —, instados a analisar um dossiê com denúncias à gestão intervencionista. Depois de um ano e nove meses retido na secretaria da SODS, o dossiê, por pressão da comunidade universitária, foi finalmente submetido ao Consuni, em reunião presidida por seu decano, haja vista o impedimento do interventor, de sua vice e de seus pró-reitores, conforme preceito estatutário. Como resultado da deliberação deste conselho, o processo, seguindo trâmite regimental, foi encaminhado para exame ao Conselhão, a reunião dos três conselhos superiores. Desta feita, foi vergonhosamente desconsiderada, por parte da administração superior, a questão do impedimento, ficando a cargo da vice-interventora a presidência de uma sessão para análise de documento no qual ela está diretamente implicada. Durante horas seguidas não faltou, por parte dos conselheiros, apresentação de argumentos éticos, regimentais, recursos, questões de ordem sobre o dito impedimento, mas nada pôde convencer a mesa da condição de suspeição da vice-interventora para a presidência da reunião. De forma obstinada, ela se manteve na posição arbitrariamente ocupada, resguardada por intervenções repetidas do secretário da SODS e do procurador-geral da UFPB — este, alçado a uma condição de oráculo, emissor e intérprete único da lei, ungido pelos deuses legisladores, representava ora Métis, ora Diké, encarnando a justiça humana e divina em apenas um ser. Tomou a palavra repetidas vezes e, ao perceber que qualquer intermitência pudesse fazer a reunião sair dos trilhos planejados, lançava sobre os conselhos o dom da ameaça de notícias crime, representações extrajudiciais e aplicação de vetos.
Após reiteradas demonstrações de autoritarismo e autocracia, a vice-interventora — que, mesmo impedida pelo regimento da UFPB, não reconheceu em nenhum momento sua frágil posição ética, política, jurídica e administrativa, insistindo em obstruir uma reunião legítima que acarretaria na sua destituição e de seu titular — deu por encerrada uma sessão que nem sequer foi oficialmente iniciada, pois que não se pôde ir além da discussão sobre o impedimento da presidência.
Diante desse descalabro e da lamentável posição defendida pela vice-interventora, a atuação do procurador da UFPB também se mostra elegível para fazer parte do acervo de memórias dessa infeliz gestão que parodia a ditadura em nossa instituição. Em uma época multiplataforma, este texto talvez não descreva com a desejada vivacidade a postura inaceitável de um procurador que há muito tempo deixou de ouvir seus conselheiros e de defender os interesses da res publica, para agir de forma a subtrair dos Conselhos Superiores da UFPB a autonomia e a capacidade de decidirem questões que importam profundamente ao âmbito administrativo da instituição e sobre as quais têm poderes regimentais para deliberar.
Há, hoje, por todo o exposto, um claro deslocamento do método de governança da UFPB, que deixou de lado a construção de resoluções amplamente acordadas colegiadamente para adotar portarias, espécie de versão local de medidas provisórias. Esse procedimento não seria possível sem uma atuação orgânica da procuradoria da UFPB nesse quesito, uma interferência jurídica severa na vida administrativa e um decréscimo visível das relações democráticas na universidade. A reunião do dia 16 de maio, mais um ato no processo de destituição do reitor-interventor e da vice-interventora da UFPB, foi uma amostra de como esse abuso autoritário vem interferindo na vida universitária, ao impedir, deliberadamente, os Conselhos Universitários devidamente eleitos de determinar os rumos da instituição. O vídeo dessa reunião, gravado pela ADUFPB e disponível no Canal A do sindicato, dá uma ideia precisa do nível de atuação autoritária e perniciosa que se instaurou nesse modelo de governar do procurador-reitor. Embora detentor de poderes e atribuições que poderiam auxiliar no debate público, propondo norteamentos jurídicos e normativas às deliberações e esclarecendo os poderes e limites das legislações, o procurador prefere, a todo instante, afrontar a maioria, comportando-se ora como autoridade máxima das reuniões colegiadas, ora como o próprio gestor da UFPB. Para isso, cria uma cisão nos colegiados, tanto entre aqueles que possuem saber jurídico — e que, portanto, consideram-se dignos de opinião de poder decisório e são capazes de ir ao embate nesse campo — quanto entre os que não dominam esse conhecimento — e que, por isso, sentem-se tímidos para opinar e escolher. Isso é uma extrapolação sem precedentes do papel de um procurador em suas atribuições, devidamente orientadas pela LEI COMPLEMENTAR Nº 73, DE 10 DE FEVEREIRO DE 1993, que institui a Lei Orgânica da Advocacia-Geral da União, que normatiza seus poderes e deveres legais.
Não há dúvidas de que hoje convivemos com uma usurpação do poder na UFPB. Atitudes orquestradas entre interventor, vice-interventora e procurador desqualificam os conselhos, obstruindo sua atuação e cerceando as posições dos conselheiros, alimentando a animosidade de forma proposital e permitindo que o caos seja perpétuo — tudo em nome de uma governança sem legitimidade política e vazia de conteúdo. No entanto, muitos de nós permanecemos firmes no embate, em defesa da universidade pública, porque temos uma democracia resiliente, assim como seus defensores. O dossiê apresentado pelo Comitê pela Autonomia e contra a Intervenção na UFPB e a insígnia Reitora Eleita/ Reitora Empossada são manifestos interesses de nossa comunidade — e esses temas, sim, deveriam ser defendidos por quem tem o dever de garantir a constitucionalidade e a ordem das instituições. O que estamos testemunhando, em tempos ainda sombrios, consiste em um reitorado intervencionista aparelhado por uma procuradoria que se mostra cada vez mais orgânica e ideológica, no sentido mais ideológico desse conceito. Cabe à comunidade universitária, de modo geral, fazer o que a administração intervencionista, em sua dupla mão — de gestão e jurídica —, não está disposta a fazer, isto é, refletir sobre o atual momento e perscrutar os melhores meios de remediar a situação insustentável que se nos apresenta.
No dia 29 de maio, em consequência de uma autoconvocação, os três conselhos se reúnem novamente. Será mais um momento decisivo na luta dessa comunidade contra o abuso e o autoritarismo de agentes públicos que comprovam todos os dias a sua carência de virtudes necessárias para uma convivência universitária e democrática plena. A ADUFPB convida todos e todas a se fazerem presentes nessa reunião, assumindo coletivamente a luta contra a arbitrariedade, o abuso e a usurpação dos poderes de sua comunidade universitária.