Durante três dias (24 a 26), cerca de cem docentes de diversas regiões do país se reuniram em Pelotas (RS) para debater questões de gênero, raça e diversidade sexual, a interseccionalidade desses temas e a relação com a universidade, no Seminário Integrado do Grupo de Trabalho de Políticas de Classe para questões Étnico-raciais, Gênero e Diversidade Sexual (GTPCGEDS). O evento foi composto por três seminários: III Seminário Nacional de Mulheres, II Seminário Nacional de Diversidade Sexual e o II Seminário de Reparação e Ações Afirmativas.
As provocações e reflexões propostas pelos debatedores, os relatos feitos pelos participantes e as apresentações culturais, que abriram cada palestra, contribuíram para aprofundar as discussões e permitir um olhar mais amplo e aprofundado sobre temáticas como feminismos trans e negro, o racismo, machismo e lgbtfobia no mundo sindical e acadêmico, e as ações afirmativas transitórias e o impacto da política de cotas nas universidades.
Fabiane Tejada, presidente da Associação dos Docentes da Universidade Federal de Pelotas (Adufpel Seção Sindical do ANDES-SN), que sediou o evento, ressaltou que a realização do Seminário contribuiu para reorganizar e fomentar os debates do GTPCEGDS local.
“A própria organização do evento, para nós, teve um caráter disparador da possibilidade de nos reorganizarmos. Inclusive, a ideia de fazer o evento nos motivou para rearticular o GT local, e trouxe aqui para o nosso cenário o debate sobre essas questões fundamentais, que estão pipocando dentro da universidade. Só para dar um exemplo, já tivemos nessa semana, nesses dias do evento, uma denúncia de um estudante de pós-graduação negro que sofreu racismo por parte de seu orientador. Então, as questões problematizadas aqui foram centrais para nós, centrais para essa conjuntura, para que possamos subsidiar nossos debates militantes e acadêmicos, que vivemos na luta diária pela implementação de políticas para uma universidade pública, plural e popular”, contou.
Fabiane destacou o debate as ações afirmativas transitórias, que se traduzem também nas políticas de cotas nas universidades, que, no caso da Ufpel, vem sendo acompanhada de perto pela seção sindical, para garantir que se efetive. “Nós temos uma comunidade negra fortíssima na cidade de pelotas. O resgate feito na mesa do último dia sobre a opressão e violência contra a população negra, quilombola, indígena também foi fundamental. Nós temos também os kaigangs, que é um grupo que está tentando também fazer o enfrentamento e se reorganizar. Nós estamos acompanhando esses debates aqui em Pelotas nos últimos tempos e a localização do evento para nós foi estratégica para podermos fomentar essas políticas, porque a seção sindical acaba fazendo uma grande mobilização e pressão junto à reitoria e faz ainda um papel de fiscalizadora, em relação à política de cotas. Nós saímos com gás, muito animados para dar a fundamentação necessária e propor ações com esse foco”, completou.
Na avaliação de Caiuá Al-alam, 1º secretário da Regional Rio Grande do Sul e da coordenação do GTPCEGDS, o seminário integrado foi um sucesso e as discussões contribuíram muito para indicar ações para construir propostas de políticas a serem apresentadas no próximo congresso do Sindicato Nacional, que acontecerá em janeiro de 2018, em Salvador (BA).
“A gente estava desde 2009, 2012 e 2013, sem realizar seminários específicos de cada tema do GTPCEGDS. Nós tivemos cerca de 100 inscritos, o que mostra o desejo da base de participar desse debate. Tivemos mesas extremamente qualificadas, que foram muito elogiadas, e que trouxeram debates importantíssimos para o campo da esquerda, inclusive a respeito de especificidades que às vezes a gente não tem tanta proximidade, como o feminismo trans e o feminismo negro. Então, foi uma série de discussões complexas, que reforçam a luta de classes do ANDES-SN”, afirmou.
Após o Seminário Integrado, aconteceu, no domingo (27), uma reunião conjunta dos GTPCEGDS, com o GT de Ciência e Tecnologia (GTC&T) e o GT de Políticas Agrárias, Urbanas e Ambientais (GTPaua), conforme deliberado no último congresso do ANDES-SN, no início do ano. “Ontem, a gente pode discutir de forma muito dura, devido a conjuntura em que estamos, a questão da demarcação de terras indígenas e quilombolas, e trabalhar interseccionalmente os temas concernentes aos três GTS. Isso mostra, de novo, por ser uma deliberação do congresso, ou seja da própria base, o interesse em congregar, de forma mais radical, inclusive dentro dos outros gts, esses temas que por muito tempo foram tratados como menores pela esquerda, como a reparação histórica de negros e negras, os direitos das comunidades lgbts e das próprias companheiras mulheres”, relatou Caiuá.
“Discutimos uma radicalização da compreensão do que é permanência para nossos estudantes dentro da universidade, em relação às cotas e ações afirmativas, e a necessidade de entender as ações afirmativas como um elemento para as reparações dentre outras tão importantes como o próprio acesso e direito a terra. Entender essas ações dentro do hall das reparações de forma mais complexa, e inclusive discutimos bastante o problema das fraudes colocadas nos processos seletivos de cotas, com brancos entrando em vagas de negros e indígenas, e debatemos bastante sobre como agudizar a discussão a respeito das comissões de verificação”, complementou.
O diretor do Sindicato Nacional ressaltou ainda o debate relacionado à comunidade LGBT e a necessidade de entender a dinâmica da trajetória desses diferentes grupos de pessoas e lembrou a provação feita pelos palestrantes para que o sindicato e a base entendam a realidade da comunidade LGBT também dentro da universidade, e ainda, refletir como o sindicato nacional e a categoria docente estão preparados para dialogar com companheiros e companheiras trans. “Há um desconhecimento relacionado a essas realidades. O seminário nos ajudou complexificar o entendimento do que é ser LGBT no Brasil. Foi muito importante a participação tanto do companheiro da CSP Conlutas quanto também a companheira que veio dialogar sobre a comunidade trans, que de fora do sindicato acabou sendo uma bomba provocadora para a gente extrapolar os nossos muros da categoria e pensar esse outro conjunto da classe trabalhadora”, concluiu, destacando que o número de participantes que se deslocaram à Pelotas superou as expectativas da organização. Foram 96 docentes, de 20 seções sindicais, e ainda 14 representantes de outros movimentos sociais e sindicais, totalizando 110 participantes.
De acordo com Caiuá, atendendo a outra deliberação do 36º Congresso do ANDES-SN, durante o evento, foram registrados depoimentos dos participantes que depois resultará em dois documentários sobre a trajetória de docentes LGBTS e negros e negras dentro da universidade e do movimento docente. O material está sendo produzido em parceria com a Seção Sindical dos Docentes da Universidade Federal de Santa Maria (Sedufsm SSind).
Fonte: ANDES-SN