José Flávio Silva (*)
Ontem, 27/10/2014, vi na internet uma proposta interessante: o quadro acima mostra o mapa do Brasil dividido entre azul e vermelho. o vermelho indicando “NOVA CUBA”. O azul sem indicação só com algumas anotações. O vermelho corresponde às regiões Nordeste e Norte. O azul, as regiões Sudeste, Sul e Centro–Oeste. Da região Sudeste fica excluído o Estado de Minas Gerais. A proposta é da professora Eleika Rezende, também acumulando a função de vereadora (PSDC) da cidade Natal, Rio Grande do Norte. Ela propõe o separatismo após concretizado o final da eleição onde Nordeste e Norte votaram maciçamente na candidata Dilma Rousseff.
A História do Brasil é recheada de levantes separatistas. Manoel Correia de Andrade em seu livro “Raízes do separatismo no Brasil” mostra a onda separatista incrementada na História do Brasil.
O primeiro momento separatista aconteceu no século XVII com a conquista holandesa. Embora a origem da conquista holandesa esteja em razão da guerra entre Holanda e Espanha respingou na colônia Brasil, onde índios desentenderam-se – Poty/Felipe Camarão; brasileiros: Calabar. Trinta anos após a primeira conquista, os holandeses foram expulsos. Voltou a união colonial.
Um pouco adiante, século XIX, D. João VI, monarca do Reino Unido, enfrentou na região Norte, precisamente em Pernambuco o levante separatista de 1817, cujo movimento foi sufocado pelas tropas reinóis. A marca ideológica ficou. O movimento foi forte e conduzido para novo movimento separatista, agora com esplendor de império.
Em 1820 D. João VI foi obrigado, se quisesse ficar no poder, a voltar a Portugal. Foi o que fez. Embarcou para terras lusitanias. Antes, para não desvincular o Brasil de Portugal deixou seu filho, o príncipe Pedro, como regente da Colônia. Com essa autoridade sentiu-se poderoso e expôs seu estilo pessoal, desagradando os dirigentes do outro lado do oceano Atlântico. Encurralado, ou o príncipe Pedro obedecia os mandos de Portugal, ou seu próprio estilo. Optou por si e declarou o Brasil separado de Portugal, constituindo o único império das Américas pós descoberta.
No entanto, no Norte do Brasil essa postura do imperador D. Pedro I não foi aceita com bom grado. A postura ideológica compartilhava com as outras colônias independentes do jugo espanhol. Continuação do reino de Portugal não era o desejado pelos separatistas pernambucanos. Esse ideário estava patente na rebelião de 1817. Alguns remanescentes de 1817, frei Caneca, por exemplo, surgiram como líderes dessa postura e deflagraram o movimento separatista de 1824, conhecido por “Confederação do Equador”. Também foi sufocado, rolando algumas cabeças, entre elas a do frei carmelita.
D. Pedro I enfrentou outras rebeliões de insurreições. No entanto, foi seu filho D. Pedro II quem sustentou a maior onda separatista denominada “Revolução Ferroupilha”, no Rio Grande. segundo Manoel Correia de Andrade:
“Na verdade, temos que admitir que desta revolução participou um e outro grupo, ao mesmo tempo, e, durante a luta houve pressões no sentido de que o Rio Grande, independente, formasse uma confederação com o Uruguai, Entre Rios e Corrientes;” (página 91, op. cit.)
A onda de nordestinos encaminharem-se para o sul do Brasil formou uma barreira entre Sul e Norte, levando o paraibano Epitácio Pessoa, investido no cargo de presidente do Brasil a dividir o território geográfico em regiões Norte, Sul, Nordeste, Sudeste e Centro. Com essa divisão o homem nordestino assumiu um caráter que o estigmatizou, revelando preconceitos imputado a ele. Gonzaga Rodrigues, cronista do jornal O Norte, em crônica do dia 13/02/2003, escreveu:
“Somos distinguidos com este libelo da professora Ângela Bezerra de Castro:
´Que existe no Sul/Sudeste do Brasil um disfarçável preconceito contra os nordestinos não é novidade. Cada contacto com o Rio ou São Paulo é oportunidade para a comprovação deste sentimento pervertido que fragiliza a certeza da unidade nacional.
Fazendo a pós graduação no Rio, cheguei a ouvir de um professor a insinuação de que eu não seria capaz de escrever uma tese, por haver cursado a graduação na Paraíba. E colegas do mestrado achavam que o melhor de nossa permanência por lá era o fato de podermos nos alimentar bem durante aquele período, livrando-nos de comer ratos.”
Ângela Bezerra sentiu in loco o preconceito separatista existente no Brasil. Esse manifesto preconceituoso foi realizado inter-muros. O pior veio depois como narra a professsora:
“Desde que ouvi estarrecida a entrevista do ministro Gaziano, na FIESP, lançando o programa Fome Zero, procuro nos jornais e televisões comentários críticos, protestos contra o crime cometido por ele ao caracterizar os migrantes Nordestinos como marginais. Reduzindo-os a bandidos contra os quais se faz indispensável a proteção dos carros blindados.
Não é possível silenciar. E muito menos aceitar a desculpa esfarrapada de que não existe preconceito neste discurso nazista:
´Temos de criar emprego lá, temos de gerar oportunidade de educação lá, temos de gerar cidadania lá porque, se continuarem vindo para cá, vamos continuar andando de carro blindado.”
Agora chegou essa grande separação eleitoral, Temos diante de nossos olhos uma linha divisória geográfica proporcionada pelo eleitor votante. Não há como negar a separação, os eleitores digitaram números e abriram as portas da separação e mostraram que é fato concreto. Esse processo de caminhar mostra a dialética inerente ao processo histórico. Certamente, essa divisão estava intrínseca no interior histórico esperando o momento de vir à tona, acontecendo agora em 2014.
Esse fio histórico delineado sobre o separatismo tem a sutileza de um fio condutor. Fio condutor que mantém viva a formação dialética. Hegel, o mestre da dialética, mostra na história essa ligação da tese à síntese. Modestamente, esse processo histórico do separatismo concretizou-se nas urnas da última eleição. A antítese camuflava o andamento simples da tese até que a síntese aflorou na digitação de dois números e dois números. A exortação do ministro Gaziano contribuiu para a explosão da síntese.
Agora, inicia-se nova tese manifestada na busca do diálogo, na solidificação da paz, em momento de vestir branco para que a nação seja uma, em sua totalidade, enfrentando problemas que lhes são inerentes. Novamente os eleitores participarão desse novo caminhar do fio histórico que a dialética proporciona.
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(*) José Flávio Silva, professor aposentado da UFPB