Na sexta-feira (31) e no sábado (1º/9) tiveram lugar mais dois painéis do Seminário “O Serviço Público que Queremos”. O evento foi organizado pelo Fórum das Entidades Nacionais do Serviço Público Federal (Fonasefe) e pelo Fórum Nacional Permanente de Carreiras Típicas do Estado (Fonacate) e ocorreu em Brasília (DF).
O terceiro painel do evento, intitulado “As Reformas Trabalhista, Previdenciária e Administrativa e seus impactos sociais”, teve como palestrantes Rogério Silva Araújo (auditor fiscal), Érika Andreassy (Ilaese), Roberto Gonzales (Afipea) e Floriano de Sá Neto (presidente da Anfip), sendo mediado por Paulo Garrido (Asfoc-SN) e Cleide Viana (Assibge-SN).
O primeiro palestrante, Rogério Araújo, tratou da Reforma Trabalhista. Munido de dados, ele destacou que em nove meses da nova legislação em vigor só tivemos piora, degradação dos contratos de trabalho e aumento do desemprego. A população empobreceu, com redução de 9,1% na massa salarial. Em comparativo, Rogério citou o México, que reduziu em quase 50% a massa salarial com uma reforma semelhante da nossa.
“Essa Reforma não veio para criar emprego, veio para retirar o trabalhador da Previdência Social e criar uma massa precarizada; ela vai gerar problemas sociais muito mais graves do que os que já temos experimentado”, frisou Rogério. Ele também destrinchou as mudanças na lei ponto a ponto, citando a criação da figura do “trabalhador hipersuficiente”, a insegurança jurídica para o trabalhador e o “negociado sobre o legislado” apenas no sentido de retirada de direitos.
Érika Andreassy deu continuidade ao painel falando sobre a nova lei das terceirizações, que permite a terceirização das atividades-fim das empresas. Em sua visão, o Estado tem interesse em extinguir a Justiça do Trabalho. Ela também afirmou que a aprovação da nova lei pelo STF na quinta (30) era previsível, visto que se tratava de uma contrapartida para a aprovação do reajuste do Poder Judiciário.
“A terceirização no Brasil é anterior à década de 1990 e vem se ampliando cada vez mais após a reestruturação produtiva; ela já existia e o que o Supremo validou não foi a terceirização pura e simples, mas a terceirização da atividade-fim”, afirmou Érika.
Em seu entendimento, o processo de terceirização da finalidade das empresas vai ter impactos nos serviços públicos futuramente, por isso há uma generalização sobre a realidade dos servidores do Estado, como se todos eles estivessem recebendo aumentos, escondendo a verdade da população: que os salários do funcionalismo também estão arrochados e que os governos (federais, estaduais e municipais) não vêm cumprindo os compromissos firmados com as categorias.
Roberto Gonzales interviu para tratar da Reforma Administrativa, que tanto tem atacado os servidores públicos, mas protege 1/3 do efetivo federal: as Forças Armadas. Com quadros e tabelas, demonstrou o déficit de pessoal que o Brasil tem em relação a outros países: Estados Unidos e Inglaterra, por exemplo, possuem, respectivamente, 16,5% e 16,2% da força de trabalho no serviço público, enquanto no Brasil esse percentual é de 11,9%.
“O inchaço da máquina administrativa é um mito, é criminoso apontar o dedo para os servidores públicos e culpá-los pela crise fiscal”, afirmou Gonzales. Ele ainda lembrou que o Brasil está passando por uma transição demográfica, com o envelhecimento de sua população. E que uma população envelhecida precisará de mais serviços do Estado. E registrou que por terem um nível maior de sindicalização, os servidores públicos conseguem negociar melhores salários em detrimento aos trabalhadores da iniciativa privada, reforçando a importância das entidades de classe.
E, por fim, Floriano Neto abordou a Reforma da Previdência de Michel Temer, proposta pela PEC 287/2016. Ele foi enfático ao afirmar que o interesse da previdência privada (bancos) pelas aposentadorias dos brasileiros foi determinante para a construção desta PEC. Falou da importância de unidade da classe trabalhadora para derrotar o projeto, que “põe todos no mesmo barco, servidores públicos e trabalhadores da iniciativa privada”.
Demonstrou, também com gráficos e dados oficiais, a inexistência de déficit na Previdência, deixando clara a diferença entre o que é divulgado pela imprensa, a forma como se divulga e as contas públicas como de fato elas são. “A Anfip faz as contas tendo por metodologia o texto da Constituição Federal (…) isso dá trabalho, pois a maioria dos números que precisamos estão ‘escondidos’ pelo governo”, registrou Floriano.
Ele terminou sua palestra de maneira taxativa: “as pessoas estão perdendo renda, estão perdendo os empregos e saindo do mercado formal, o que inviabiliza o crescimento econômico; não tem como isso dar certo”.
Painel 4: organização sindical
O segundo painel de sexta-feira foi dedicado ao debate de “Organização Sindical, negociação coletiva e data-base”. Coordenadas por Adilson Rodrigues (Fenajufe) e Naara Aragão (Fasubra), as palestras foram feitas por Patrícia Pelatieri (Dieese), Rodrigo Camargo (Cezar Britto Assessoria Jurídica) e Cacau Pereira (Ibeps).
Patrícia iniciou sua apresentação traçando um panorama das mudanças no mundo do trabalho e citou algumas das consequências da chamada revolução tecnológica, como a velocidade da comunicação e os trens completamente automáticos que já circulam em São Paulo. Ela chamou atenção para o fato de que as condições de trabalho, e as respectivas reformas que as modificam afetam as condições objetivas das lutas dos trabalhadores e nas negociações coletivas. Patrícia também apresentou diversos dados recentes do Sistema de Acompanhamento de Greves do Dieese (SAG).
“Os trabalhadores fizeram muitas greves no primeiro semestre de 2018, no serviço público já chegam a 520 greves, sendo 13 delas no âmbito federal”, explicou. Confira todos os dados mostrados pela palestrante (em PDF). Ela ainda mostrou dados do IBGE e do Cadastro Nacional de Entidades Sindicais (CNES), e comentou os desafios dos dirigentes sindicais do serviço público nos dias atuais. “As negociações não são periódicas, a terceirização avança cada vez mais, as políticas de austeridade se agravam e ainda é preciso enfrentar a oposição da população”, enumerou.
Destacando a importância da unidade na atuação das entidades sindicais, Rodrigo comentou o panorama das transformações no mundo do trabalho, quando citou o teórico Ricardo Antunes. Ele pautou a crise dos sindicatos, ainda muito amarrados ao Estado, localizando-a no contexto do capitalismo, “que privilegia o capital ao ser social”.
A relação dos sindicatos com os movimentos sociais foi colocada por Rodrigo como fundamental e determinante no combate à pulverização e fragmentação do movimento sindical. Comentando a Revisão Geral Anual (data-base) dos servidores, ele defendeu que o enfrentamento não deve se dar apenas no âmbito judicial, se estendendo também ao executivo, ao legislativo. “Não há outro caminho que não passe pela interseção dos três poderes, e pela luta, porque a luta é nosso melhor remédio”, destacou Rodrigo.
Cacau Pereira fez uma retomada histórica do papel dos sindicatos de servidores públicos no país, destacando a retomada, em 2011, de numerosos movimentos grevistas “a quantidade de greves se aproximou ao período de 1986 a 1989”, destacou. Ele pautou também as conquistas da constituição de 1988, pela CLT para o conjunto dos trabalhadores, destacando que “é preciso reconhecer para o trabalhador público os direitos que já existem para o trabalhador privado”.
Abordando a negociação coletiva no serviço público, Cacau relembrou o PL 3831/2015, vetado por Temer, e também mostrou posicionamentos de ministros do STF contra as greves em geral. Ele defendeu ainda a importância de romper com a lógica de cooptação e incorporação dos sindicatos imposta pelo capitalismo. “A classe trabalhadora tem sim a capacidade de se mobilizar, a greve geral de abril de 2017 nos mostrou isso, mas ainda temos dificuldades de articular as direções”, comentou.
Painel 5: ataques e desafios
Com o tema “O desmonte dos serviços públicos e os desafios para os servidores das três esferas de governo”, o quinto e último painel do evento foi realizado. Além de Antônio Queiroz, do Diap, compuseram a mesa: Laurizete Gusmão (Fenasps), Sérgio Ronaldo (Condsef), Rudnei Marques (Fonacate) e Rogério Expedito (Fonasefe).
Defendendo a posição de que a suposta crise entre os três poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário) é apenas mais uma cortina de fumaça para disfarçar os ataques do capital, Antônio Queiroz (do Diap) enumerou diversos elementos de articulação entre eles. “Os três poderes se uniram, de maneira harmoniosamente coordenada, para retirar direitos dos trabalhadores”, denunciou. Reforçando as afirmações feitas ao longo do evento sobre os efeitos da Emenda Constitucional nº 95/2016 (EC 95), ele enumerou diversas perdas que a medida impõe tanto para o trabalhador quanto para a classe. “O país entrará em colapso se a EC 95 não for revogada em no máximo dois anos, especialmente em relação à seguridade social”, afirmou. Pautando o processo de golpe de 2016, ele destacou que é um acerto, sem dúvidas, acusar os parlamentares de golpistas, no entanto, o mesmo não cabe à parcela da população que estava mal informada.
Rogério Expedito traçou um histórico do Fonasefe, comentando as greves e mobilizações que envolveram as dezenas de entidades que o compõem. Informou também sobre a campanha de denúncia da EC 95 que o fórum prepara para informar e instrumentalizar os trabalhadores, aos moldes do que aconteceu no debate da reforma da previdência. “Também precisamos reorganizar os comitês regionais e locais, compreendendo que os servidores federais, estaduais e municipais integram um mesmo conjunto, debatendo a forma como prestamos serviços públicos à sociedade” destacou Rogério.
Comentando a conjuntura nacional e destacando a importância de localizá-la no contexto mundial, Rudnei Marques defendeu a unidade entre os trabalhadores. “A possibilidade de retrocesso está sempre ali adiante de nós e isso acontece no mundo inteiro”, lamentou. Em sua intervenção ele elencou diversos argumentos filosóficos e mitológicos, relacionando-os aos desafios colocados ao conjunto dos servidores públicos.
Completando o último painel do evento, Cezar Britto (advogado, ativista e ex-presidente da OAB) também se posicionou. Ele defendeu as cotas sociais e raciais no judiciário para frear seu distanciamento da sociedade e a sua transformação num agente do capital. “O judiciário se transforma diariamente num grande inimigo da classe trabalhadora, a aprovação da terceirização irrestrita foi mais um exemplo disso”, defendeu. Ele também denunciou que diariamente a EC 95 está sendo “revogada” para atender aos interesses da classe dominante. “Quando os juízes reajustam seus salários, por exemplo, a emenda não é considerada”, destacou.
Com edição e inclusão de informações de ANDES-SN. Imagem de Sinasefe.
Fonte: Sinasefe